Cadeira nº 19
CRCSC 11.898-6 T
O professor Nicanor nasceu em Ibaiti, no estado do Paraná, em 18 de outubro de 1945. Ele não gostava do seu nome, preferia ser chamado de Duqueviz, mas tinha vários apelidos. Sua esposa o chamava de Duca ou Duquinha e sua mãe e irmãs o chamavam de Neno. Era o segundo filho mais velho do casal Ladislau e Bárbara. Como o primogênito do casal morreu ainda criança, cresceu como o mais velho de dois irmãos e três irmãs. Ladislau era polonês e imigrou ainda criança para o Paraná, Bárbara nasceu em uma comunidade polonesa no mesmo estado.
O pai era carpinteiro e a mãe lavadeira e a falta de dinheiro dos pais fez com que a família mudasse várias vezes pelo interior do Paraná em busca de melhores empregos e mais oportunidades para a família. Dessa forma, a infância do Neno foi cercada por um senso de família bem forte, mas muitas dificuldades financeiras, tendo um pai que o estimulava a ler. E de mudança em mudança, acabou se tornando adulto em Guaíra, Paraná, onde entrou para o exército como uma possibilidade de emprego e ascensão social. Antes, porém, trabalhou com os dois irmãos em uma olaria. Os irmãos costumavam dizer que ele não trabalhava na olaria, ele lia na olaria. Reza a lenda familiar de que ele dava ordem para os irmãos fazerem o seu serviço enquanto ficava lendo, hobby que o acompanhou a vida toda.
Casou-se com Neuza em Guaíra e tiveram três filhas em Apucarana, Paraná: Barbara Cristina, Bianca e Beatris. Ele não teve a chance de conhecer seus três netos: Gabriel, André Luis e Alice, que nasceram em Brasília, Distrito Federal; Resende, Rio de Janeiro; e, Rio de Janeiro, Rio de Janeiro, respectivamente. A família definitivamente tem a migração em seus genes.
O Duqueviz era um gozador de marca maior. Apresentava-se super sério para as pessoas que não o conheciam, ficava com cara de bravo só para depois dar uma gargalhada do constrangimento do outro. Adorava contar piadas, que às vezes só ele achava graça, para depois dizer “olha como eu sou engraçado!”. Era um ótimo conselheiro porque sabia ouvir, mas suas principais características eram ser curioso, apreciador de livros, leitor interessado em qualquer assunto, mas principalmente nos livros do Frederick Forsyth, caseiro e misterioso. Ele era capaz de ficar na sala de jantar onde ficava a televisão lendo seu livro, assistindo TV e prestando atenção às conversas e ao movimento da casa. Não gostava de viajar, sua casa era o seu reino. Nunca se sabia exatamente o que estava pensando ou o que realmente pensava, fazia gozação de tudo até dos assuntos que levava muito a sério, como religião e fé. Foi maçom muito atuante na maçonaria e desconversador sobre o assunto em casa ou com os curiosos.
Uma de suas irmãs conta duas histórias que ilustram um pouco sua personalidade. Quando ela era criança e Neno já um adolescente, ele pegou um sapo e jogou nas costas dela. Ela entrou em pânico a ponto de não conseguir gritar ou falar. Ele imediatamente arrancou o sapo de seu corpo e ficou preocupado. Que se tem notícias, nunca mais jogou sapo em ninguém, mas continuava ameaçando e fazendo as pessoas gritarem ou correrem todas as vezes que um desses anfíbios pulava para dentro de casa nos tempos molhados de Cáceres. A outra história que essa irmã conta é que ela era pequena e queria muito um chinelo, mas chinelo era artigo de luxo. Uma vez, ela viu a vizinha esconder o chinelinho para não sujar na lama, então resolveu “pegar o chinelinho emprestado, sem que a vizinha soubesse”, porém não contava com o fato da vizinha bater na sua casa e contar para o Neno que a tinha visto pegar o chinelinho. Quando soube, ele ficou muito bravo e a fez devolver o chinelo e pedir desculpas.
Tinha um Dodge 79 bege, que comprara já de segunda mão em Brusque, Santa Catarina, mais uma das cidades que fez parte da trajetória da família. O chebinha ou dodginho, como carinhosamente era apelidado, acompanhou a família até 1994. Todos os anos, Duqueviz reformava o carro, pintando toda a lateria e, algumas vezes, trocando o estofamento. Uma vez, chegou com um novo velho dodginho em casa, dessa vez azul, que o antigo dono utilizava para carregar porcos e galinhas do sítio. Justificou dizendo que o motor do carro era muito bom e que iria substituir pelo motor do chebinha, dando mais uma sobrevida para seu xodó.
Contabilidade foi sua segunda formação, antes ele já havia concluído o curso em Educação Física pelo Exército Brasileiro. Ele se formou em 24 de julho de 1981, pela Fundação Faculdade Estadual de Ciências Econômicas de Apucarana, quando suas filhas já eram nascidas, conciliando trabalho, família e faculdade. Contabilidade para ele era uma Ciência Exata e acreditava no seu resultado. Não gostava de ficar forjando arrumações no Balanço Patrimonial. Quando era estudante, preferia não dar continuidade em alguma atividade a dar um jeito de fazer o balanço bater quando não tinha tempo para localizar o erro. Tinha começado a fazer perícia contábil e estava se preparando para ser auditor contábil. Contabilidade era algo sério para o Duqueviz.
Como leitor ávido, ele era apaixonado por livros. Ao longo de sua vida, foi acumulando um vasto acervo bibliográfico que se orgulhava bastante. Quando construiu a casa da família, fez um quarto ligado a sala para acomodar sua coleção. Pensou em cada detalhe da biblioteca, desde como deveria ser a estante que acomodaria os livros até a cor da parede – amarela, para estimular a mente. No seu acervo, tinham muitos livros de contabilidade que foram doados à Universidade do Estado de Mato Grosso-Unemat.
Tinha muitos sonhos, mas o principal deles ele realizou: aposentar-se do exército e tornar-se professor. Era muito feliz sendo professor. Sempre se apresentava como professor. E nesse ofício se envolveu muito com preparação de apostilas, exercícios e didática. Começou a dar aulas no Técnico em Contabilidade logo que chegou em Cáceres-MT. Depois que se aposentou, foi convidado para iniciar o Curso de Ciências Contábeis da Unemat, nesse sentido, consta nos registros do curso sua indicação para trabalhar as disciplinas: Contabilidade Introdutoria, Contabilidade Básica, Contabilidade Geral e Contabilidade de Custos. Foi Chefe de Departamento do curso de 1994 até o seu falecimento.
Uma curiosidade do professor Duqueviz: ele tinha um mimeógrafo em casa! Mimeógrafo, para os mais novos, foi o antecessor da máquina de xerox. Para se ter ideia da grandiosidade do feito, geralmente, as escolas possuíam apenas uma máquina dessas. Nele, o professor Duqueviz rodava as provas que aplicava aos alunos, além das folhas de exercício. O que ninguém sabe é que para fazer essas cópias, a família toda trabalhava: enquanto ele mimeografava, as filhas espalhavam cada uma das folhas pela casa para que secassem sem borrar.
Simplesmente adorava o Mato Grosso. Desde que se casou falava em morar no Mato Grosso. Sempre pedia transferência para esse estado, mas isso só ocorreu em 1986. Foi o único da família que se mudou contente para Cáceres. Todas as mulheres (esposa e filhas) sentiam calor e se incomodavam com a poeira. Ele não. Gostava de tudo – do calor, da cidade, das pessoas, do técnico em contabilidade, da universidade, do rio, da praça, da ponte, do churrasquinho, de carros velhos, em especial do seu chebinha, da sua casa, do UBS onde foi tesoureiro, das andorinhas. Quando se mudou para Cáceres, ele disse: “é aqui que quero ficar”. Via o Mato Grosso como a terra de grandes oportunidades.
Entre esses mistérios ou pouca conversa sobre alguns assuntos, ele era um maçom graduado (tinha chegado ao número mais alto da maçonaria, mas ninguém em casa sabia disso). Numa tarde de um sábado ensolarado, estava voltando de uma reunião da Maçonaria em Cuiabá, com seu carro novo, o primeiro carro zero, quando foi atingido por um caminhão que descia na banguela a Serra do Mangaval. Não resistiu ao impacto da batida de frente e faleceu aos cinquenta anos no dia 15 de junho de 1996. Super jovem e cheio de ideias novas para uma melhor didática para o ensino de contabilidade.
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