Me refiro a dois dos principais diplomas legais que regem direito financeiro
No natal de 2015, escrevi um artigo cujo assunto trazia a mesma essência do que leremos a seguir, naquela oportunidade, findei o texto dizendo que o artigo não tinha a intenção de esgotar o assunto, muito pelo contrário, o objetivo era apresentar ao leitor mudanças significativas que estariam por vir quando da aprovação do projeto de lei que foi pano de fundo para a discussão naquele escrito.
Estou me referindo a dois dos principais diplomas legais que regem o direito financeiro e em especial aos procedimentos contábeis aplicados ao setor público, que são a Lei nº 4.320/64 e Lei Complementar nº 101/2000.Onde a Lei nº 4.320/64, continua sendo, ainda hoje, mesmo em desuso alguns dos seus artigos, a “bíblia” do contador público.
Ao passo que a Lei Complementar nº 101/2000, sem mencionar os aspectos de gestão fiscal, proporciona ao cidadão amplo acesso, inclusive por meio eletrônico, de informações referente as despesas e receitas.
E com base nessas informações, caberá à sociedade cobrar ações e providências de seus governantes. Ou seja, é a valorização do controle social, as vezes esquecida por nós mesmos. O cidadão.
Em relação a Lei nº 4.320, muitos estudiosos entendem que por ser uma lei com viés fortemente orçamentário e considerando que a muito tempo a contabilidade aplicada ao setor público emprega em sua operacionalização uma visão e sistemática voltada para o viés patrimonial, em razão disso já deveria ter sido revogada.
Concordo com este posicionamento, visto que a Teoria da Contabilidade nos ensina que dentre seus principais objetivos está o de estruturar os conhecimentos contábeis para a posterior aplicação na prática.
Sobre a revogação mencionada no parágrafo anteanterior, pode ser que aconteça, pois tramita na Câmara dos Deputados o Projeto de Lei Complementar (PLP) nº 295/2016, originado do Projeto de Lei do Senado (PLS) nº 229/2009, que quando vigente foi apelidado de Lei da Qualidade Fiscal.
Foi sobre o PLS nº 229/2009, que em dezembro de 2015 escrevi o artigo intitulado “Lei da Qualidade Fiscal – mudanças na gestão”. A quase oito anos atrás os operadores da contabilidade pública viviam a expectativa de algo novo.
Mas a expectativa foi sepultada para no seu lugar brotar um embrião capenga fabricado as coxas, batizado pela alcunha de PLP nº 295. É a verdadeira lei de Murphy.
O PLP nº 295/2016, além de revogar a Lei nº 4.320/64 e alterar a Lei Complementar nº 101/2000, estabelece normas gerais sobre planejamento, orçamento, fundos, contabilidade, controle e avaliação na administração pública.
Entendo que a ementa merece trazer de maneira expressa o termo “patrimonial”, isso porque a contabilidade aplicada ao setor público após ter adotado os padrões internacionais passou a ser utilizada como ferramenta voltada a aferir, também, o patrimônio do setor público.
Entendo também, que não será tarefa das mais fáceis contabilizarmos o patrimônio do setor público que foi ocultado, ou melhor, não contabilizado desde a edição da Lei nº 4.320. Porque desde então estávamos mergulhados no viés orçamentário.
Para os interessados no assunto, assim como eu, vão perceber que ainda estamos longe de possuirmos sistemas estruturantes para que o contador possa desempenhar satisfatoriamente suas atividades. Basta se inteirar sobre o sistema de custos no setor público.
Mas voltando ao PLP nº 295, o frade Luca Pacioli provavelmente ouviu minhas preces e ordenou ao, à época, Deputado Felipe Rigoni que apresentasse a propositura do PLP nº 25/2022, com o objetivo de emendar o PLP nº 295.
A meu ver, a ementa proposta pelo ex-Deputado ficou incomparavelmente mais rica que a original, pois, além de atender o meu desejo de incluir a expressão “patrimonial”, também buscou fortalecer a gestão fiscal responsável.
Mas como diz a lei de Murphy, nada é tão ruim que não possa piorar. Digo isso, porque já foi apensado ao PLP nº 25/2022, o Projeto de Lei Complementar nº 62/2023, de autoria do Deputado Pedro Paulo, que visa estabelecer o novo arcabouço fiscal da União voltado para a sustentabilidade da dívida, atrelada a integração das regras fiscais.
Ora bolas! Por que não tramitou esse projeto de lei separadamente? Qual será ou seria o ganho em tramitar assuntos relacionados a sustentabilidade de dívidas da União com tema estritamente contábil? A resposta só pode ser a de confundir a cabeça dos já atarefados operadores da contabilidade aplicada ao setor público e do direito financeiro.
Enfim, mesmo com a lambança de misturar arcabouço fiscal com o importante projeto de lei que adequará a contabilidade aplicada ao setor público aos padrões internacionais, não darei guarida à lei de Murphy.
Por isso, prefiro a lei de Clarke porque quando um diligente escritor e zeloso parlamentar diz que algo é possível, é quase certeza que ambos têm razão.
Claiton Cavalcante é contador.
Fonte: midianews
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